segunda-feira, 8 de março de 2010

Vida útil duplicada

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – O satélite francês Corot foi lançado nos últimos dias de 2006 com o objetivo de detectar exoplanetas – isto é, planetas além do Sistema Solar – e estudar a sismologia das estrelas. A missão, programada para durar três anos, foi bem-sucedida e acaba de ser prorrogada até o fim de 2012.
O projeto, que descobriu o primeiro planeta rochoso fora do Sistema Solar e em seus primeiros mil dias de duração já havia observado mais de 100 mil estrelas, tem participação direta de astrônomos brasileiros. Os dados obtidos pelo satélite são integralmente enviados à Estação de Satélites Científicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), localizada em Alcântara (MA).
Até outubro de 2009, as pesquisas do Corot haviam gerado pelo menos 55 artigos científicos, incluindo a descoberta do primeiro exoplaneta rochoso – na revista Astronomy and Astrophysics – e a primeira medição de oscilações estelares já registrada – que ganhou a capa da revista Science.
De acordo com o presidente do Comitê Corot-Brasil, que coordena a participação nacional no projeto, Eduardo Janot Pacheco, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da Universidade de São Paulo (USP), os resultados obtidos em ambas as vertentes da missão tiveram alto impacto científico.
“Pudemos estudar a sismologia das estrelas com uma precisão inédita e, com isso, estamos aprendendo muito sobre o funcionamento das estrelas, em especial do Sol, que é nosso principal interesse. Na outra vertente, descobrimos o menor exoplaneta até hoje e o primeiro comprovadamente rochoso – o Corot 7B –, além de inúmeros gigantes gasosos”, disse à Agência FAPESP.
A descoberta de planetas rochosos, pequenos como a Terra, é importante porque são aqueles que poderiam abrigar vida, segundo Pacheco. Mas eles não podem ser descobertos pelo método de perturbação gravitacional, como os gigantes gasosos, porque são pequenos demais para causar esse efeito.
“A única maneira de detectar os exoplanetas rochosos é o método de trânsito, utilizado pelo Corot, que registra variações na intensidade da luz que os planetas causam quando passam diante de uma estrela. Mas essa variação é de apenas um décimo milionésimo da intensidade luminosa original. O satélite precisa ter precisão e sensibilidade extremas para detectar esses eclipses quase insignificantes”, explicou.
O Corot 7B está em órbita em torno da estrela Corot 7, que está a cerca de 500 anos-luz da Terra, na constelação de Unicórnio. A estrela é ligeiramente pouco menor, mais fria e mais jovem do que o Sol. “Pela primeira vez foi comprovado que de fato existem realmente outros planetas rochosos semelhantes à Terra”, disse.
O satélite tem uma órbita peculiar, girando perpendicularmente ao equador a cerca de 850 quilômetros da superfície da Terra. Com essa órbita polar, ele pode apontar para uma região do céu durante seis meses sem que haja eclipses, observando quase 10 mil estrelas de uma vez. Depois desse período, precisa girar 180 graus para não “olhar” para o Sol, poupando seus detectores de danos irreversíveis.
“Essa dinâmica nos dá uma longa base temporal de observação. Isso é importante em especial para os estudos de sismologia estelar, pois, mudando de direção apenas duas vezes por ano, o satélite pode adquirir dados robustos sobre a pulsação das estrelas. Essa pulsação depende dos movimentos do interior da estrela e, ao estudá-la, conseguimos compreender o que se passa dentro do astro”, disse Pacheco.
O Corot leva em seu interior um reservatório de gás que fornece energia para os movimentos extras. Mas, como os movimentos são feitos apenas duas vezes por ano, ainda há gás para manter o satélite até 2012. A limitação para a vida útil não é a energia nem a durabilidade dos equipamentos, mas a disponibilidade de recursos humanos.
“O satélite mobiliza cerca de 15 engenheiros e técnicos para sua manutenção, operação e movimentação. Além disso, há equipes mobilizadas em estações espaciais de vários países participantes do programa, como a de Alcântara, no Brasil. Certamente, dentro de mais três anos as agências nacionais envolvidas com o projeto precisarão desse pessoal para outros satélites e outras missões”, apontou Pacheco.
Os dados enviados para a Terra pelo Corot são analisados por cientistas do Brasil, França, Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Holanda e Itália. Pacheco destaca que a participação no projeto é altamente vantajosa para o Brasil, que contribui com cerca de 2% do orçamento e tem acesso a 100% da pesquisa.
“É a primeira vez que o Brasil tem acesso completo às pesquisas de um satélite. Os softwares embarcados no Corot, de alta confiabilidade e alto valor agregado, foram totalmente desenvolvidos por engenheiros brasileiros, trazendo um know-how inestimável. A participação também abre portas para aumentar as parcerias com agências europeias, envolvendo formação de recursos humanos na área de pesquisa”, disse.

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