terça-feira, 9 de novembro de 2010

Presidência da República: O Epicentro de Corrupção em Angola

Introdução
 
O presente relatório revela o modo como a Presidência da República de
Angola tem sido usada como um cartel de negócios obscuros e as
consequências dessa prática para a liberdade e o desenvolvimento dos
cidadãos assim como para a estabilidade política e económica do país.
O texto responde aos apelos da política de tolerância zero contra a
corrupção decretada pelo Presidente José Eduardo dos Santos, a 21 de
Novembro de 2009.
 
Por uma questão de clareza, a investigação cinge-se a uma pequena
amostra das práticas comerciais empreendidas pelo ministro de Estado e
chefe da Casa Militar da Presidência da República, o general Manuel
Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”. A este cabe a coordenação dos
sectores de defesa e segurança do país. Com este dirigente, o chefe de
Comunicações da Presidência da República, general Leopoldino Fragoso
do Nascimento “Dino”, e o presidente do Conselho de Administração e
director-geral da Sonangol, Manuel Vicente, formam o triumvirato que
hoje domina a economia política de Angola, sem distinção entre o
público e o privado. Manuel Vicente junta ainda, aos poderes
acumulados pelos generais e a Sonangol, o facto de ser um dos membros
mais influentes do Bureau Político do MPLA, como delfim do presidente
e responsável pela fiscalização dos negócios particulares do partido
no poder.
 
A petrolífera nacional é a maior empresa do país e o maior
contribuinte das receitas do Estado. Vários analistas têm considerado
a Sonangol como o principal instrumento da manutenção do regime de
José Eduardo dos Santos nos domínios financeiro, político e
diplomático, assim como é a principal fonte de enriquecimento ilícito
dos seus principais dirigentes.
 
Em alguns casos são referidas as relações solidárias e de cumplicidade
com outros membros do executivo e gestores públicos na realização de
negócios que envolvem a pilhagem do património do Estado e outras
acções de contravenção às leis da república.
 
Sectores estratégicos como o dos petróleos, telecomunicações, banca,
comunicação social e diamantes, fazem parte do império construído por
tais figuras. A amostra refere-se às empresas Movicel, Biocom, Banco
Espírito Santo Angola, Nazaki Oil & Gás, Media Nova, World Wide
Capital e Lumanhe.
 
A Lei da Probidade Pública é usada amiúde, para melhor compreensão do
leitor, mesmo para os casos que antecedem à sua aprovação, em Março
passado, por ser uma compilação de diversos diplomas legais contra a
corrupção, que datam desde 1989.2 Todos os artigos constantes na Lei
da Probidade Pública se encontravam dispersos em tais diplomas. Por
exemplo, a Lei dos Crimes Cometidos por Titulares de Cargos de
Responsabilidade (Lei nº 21/90, não revogada pela Lei da Probidade
Pública) proíbe o dirigente de participação económica em negócio sobre
o qual tenha poder de influência ou decisão (art. 10º, 2).
 
Movicel
 
Actualmente existem apenas duas operadoras de telefonia móvel no país,
a Unitel e a Movicel. A Unitel, a operar desde 2001, resulta da
sociedade, por quotas iguais (25%), entre a Sonangol, através da sua
subsidiária MSTelcom (ex-Mercury), a Portugal Telecom, GENI e Vidatel.
A Movicel foi criada pelo governo, em 2003, como uma subsidiária da
empresa telefónica estatal Angola-Telecom.
 
No ano passado, através da Resolução n° 67/09 de 26 de Agosto, o
Conselho de Ministros determinou a privatização expedita e sem
concurso público da Movicel, a um consórcio de empresas angolanas,
pelo valor 200 milhões de dólares. Para o efeito, o órgão do governo,
invocou a dificuldade na mobilização de outros investidores para a
privatização da companhia. Argumentou, também, sobre a urgência em
gerar fundos para os cofres do governo “face à crise financeira
mundial”. Essa decisão, segundo a referida resolução governamental,
teve em conta a identificação de “uma estrutura do empresariado
nacional, que assegura os recursos financeiros vitais para a aplicação
imediata do plano de investimentos da Movicel e o encaixe financeiro
esperado para o tesouro nacional”.
 
No entanto, 59% do capital da Movicel foi transferido para duas
empresas afectas a altas patentes subordinadas ao ministro de Estado e
chefe da Casa Militar, general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior
“Kopelipa”, a Portmill e a Modus Comunicare, conforme se descreverá. A
10 de Junho de 2009, o general Kopelipa, o general Dino e Manuel
Vicente, apartaram-se formalmente da sociedade Portmill Investimentos
e Telecomunicações de que eram proprietários, com 99,96% das acções
equitativamente repartidas entre si. Cederam as suas quotas, por
intermédio do português Ismênio Coelho Macedo, a um grupo de altos
oficiais da Unidade de Guarda Presidencial (UGP), conforme tabela
abaixo descrita. No caso da Portmill, o tenente-coronel Leonardo
Lidinikeni, oficial da escolta presidencial, detém 99,96% das acções
da empresa. Na Modus Comunicare, o tenente-coronel Tadeu Agostinho dos
Santos Hikatala, responsável da escolta presidencial, é o titular de
99,92% das acções. A UGP está subordinada à Casa Militar.
 

Coube também ao gestor dos negócios privados do general Kopelipa,
Ismênio Coelho Macedo, a operação de compra e reestruturação de uma
pequena empresa de comunicação, publicidade e marketing, a Modus
Comunicare – Comunicação e Imagem Lda., que não tinha expressão no
mercado, colocando na sua estrutura accionista altas patentes do
palácio presidencial. A empresa foi transformada em sociedade anónima,
dedicada às telecomunicações, a 14 de Agosto de 2009. Essa data indica
que o processo de reconhecimento legal da transacção, a sua
transformação em sociedade anónima e alteração do objecto social
apenas ficou concluído duas semanas após o governo, dirigido pelo
Presidente José Eduardo dos Santos, ter atribuído 19% do capital da

Movicel a esta empresa.
 
A 29 de Julho de 2009, o Conselho de Ministros aprovou a privatização
de 80% do capital da Movicel a favor das empresas angolanas Portmill

Investimentos e Telecomunicações (40%), Modus Comunicare (19%), Ipang
– Indústria de Papel e Derivados (10%), Lambda (6%) e Novatel (5%).
Por sua vez, as empresas estatais Angola Telecom e a Empresa Nacional
de Correios e Telégrafos de Angola detêm respectivamente 18% e 2% do

capital social da Movicel.
 
A seguir apresenta-se uma tabela das empresas beneficiárias e seus accionistas:
 
Portmill, Investimentos e Telecomunicações (40%)
Sócio e Função
Tenente-coronel Leonardo Lidinikeni Oficial de Escolta Presidencial,
Unidade de Guarda Presidencial
Francisco Ndeufeta
Manuel dos Santos Rodrigues Cardoso
Nelson Paulo António
Tenente-coronel Francisco Mbava Acção Psicológica, Casa Militar
 
Modus Comunicare - Telecomunicações (19%)
Sócio e Função
Tenente-coronel Tadeu Agostinho dos Santos Hikatala Oficial de Escolta
Presidencial, Unidade de Guarda Presidencial
João Ricardo Belarmino
Tenente-coronel João José António Soares Conselheiro do chefe da
Unidade de Guarda Presidencial, General Alfredo Tyaunda
José Kakonda
José Luís Alves
 
Ipang – Indústria de Papel e Derivados, Limitada (10%)
Accionistas
N’datembu – Comércio Geral, Importação e Exportação Ltda.
 
A Ipang é a única empresa beneficiária que apresenta, na sua estrutura
accionista formal, empresários. A N’datembu tem entre os seus
accionistas Miguel Domingos Martins e filhos, o advogado Ildeberto
Manuel Teixeira e o português José Mamade Etbal. Outro nome associado
à Ipang é o do empresário espanhol Óscar Ouersagasti Soraluce. De
qualquer modo, a entrada no capital da Movicel é a única actividade
empresarial publicamente conhecida da Ipang.
 
Mais informações sobre este grupo e outros eventuais investidores
serão actualizadas oportunamente.
 
Lambda (6%)
Sócio e Função
José Carvalho da Rocha Ministro das Telecomunicações e Tecnologias de Informação
Aristides Safeca Vice-ministro das Telecomunicações e Tecnologias de Informação
Zulmira Mitange da Rocha Esposa do ministro José Carvalho da Rocha
Arminda Vireya Safeca de Sá Parente do vice-ministro Aristides Safeca
Antónia Dias dos Santos Caxinda
 
Enquanto director nacional das Telecomunicações, Aristides Cardoso
Frederico Safeca integrou a Comissão de Negociação da Movicel, em
cumprimento do Despacho n° 67/07 do ministro das Finanças José Pedro
de Morais, datado de 19 de Janeiro de 2007. Essa comissão era chefiada
pelo então assessor económico do Presidente José Eduardo dos Santos,
Archer Mangueira.
 
Desde 2 de Outubro de 2006, Aristides Safeca exerce as funções de
presidente do Conselho de Administração e director da empresa belga
Parisa, S.A. O mesmo Aristides Safeca, em sociedade com os seus irmãos
Alcides Safeca, secretário de Estado do Orçamento (Ministério das
Finanças) e Amílcar Safeca, director da UNITEL, são os sócios
maioritários da Trans Omnia, na qual se associam ao general Fernando
Vasquez Araújo, chefe da Direcção Principal de Armamento e Técnica do
Estado Maior General das FAA. A Trans Omnia tem sido privilegiada com
contratos multimilionários para o
abastecimento de bens alimentares às FAA, um assunto a ser abordado à parte.
 
Apesar da nova Lei da Probidade, Aristides Safeca continua, de forma
impune, a acumular funções públicas com cargos privados. O
vice-ministro para as Telecomunicações mantém-se como presidente do
Conselho de Administração e director de uma empresa estrangeira, a
Parisa (com sede na Bélgica), e a realizar múltiplos negócios com o
Estado para seu enriquecimento, de familiares e seus associados.
 
Novatel (5%)
Sócio e Função
Hélder Bruno da Gama Bento
Paula Sammer Pinto Jorge
Aurélio Vimbuando Muelecumbi

Onezandro Catinhe Mauro Santos Piedade
Marília da Conceição dos Santos Kissuá
 
A atribuição de uma quota à Novatel, na privatização da Movicel, é
mais uma prova de desvio do património público em prejuízo do Estado.
A Novatel foi criada a 29 de Abril de 2009, após apresentação do
parecer da Comissão de Negociação da Movicel e três meses antes do
anúncio formal das empresas beneficiárias, pelo Conselho de Ministros.
 
À data da privatização formal da Movicel, os sócios da Novatel, acima
descritos, não apresentavam individual ou solidariamente quaisquer
investimentos que os identificassem como empresários. Apesar das
objecções de uma das figuras citadas em assumir a sua participação no
negócio, devido à existência de expedientes jurídicos para encobrir os
verdadeiros accionistas, as acções da Novatel são nominativas.
 
Tal como os estatutos obrigam (art. 5, 1), as acções têm titulares
precisos e determinados, conforme a lista acima descrita. Para todos
os efeitos, são formalmente responsáveis pelos deveres e obrigações
decorrentes da titularidade das acções, sendo portanto os titulares
das mesmas accionistas formais.
 
Anotações sobre a Movicel
 
Os nomes revelados nas estruturas accionistas das empresas a favor das
quais o Conselho de Ministros privatizou a Movicel revelam, de forma
clara, a mentira do governo sobre o assunto. Não se trata de um
negócio sedimentado numa estrutura do empresariado nacional e muito
menos de grupos com recursos financeiros para contribuir para o
tesouro nacional face “à crise financeira mundial”, conforme argumento
oficial acima referido. A urgência a que o governo aludia para gerar
fundos para os cofres do Estado também é um engodo, pois não há
qualquer confirmação oficial e pública do pagamento dos 200 milhões de
dólares ao Estado, como é regra. Por outro lado, vários economistas
estimam que a Movicel, mesmo na venda a saldos, vale vezes mais do que
o valor estabelecido pelo governo. Trata-se de um expediente de
alienação do património do Estado a favor de desígnios privados
geridos pelo chefe da Casa Militar do Presidente da República em
cumplicidade com outros órgãos de influência junto da presidência e
dos titulares do Ministério das Telecomunicações e Tecnologias de
Informação acima mencionados.
 
Os membros do governo e altos oficiais da Presidência da República
incorrem, de acordo com a Lei da Probidade Pública, em diversas
ilegalidades. O princípio da probidade pública impede o agente
público, para o caso, de aceitar empréstimos, facilidades ou ofertas
que possam afectar “a independência do seu juízo e a credibilidade e
autoridade da administração pública, dos seus órgãos e serviços”.
 
A privatização da Movicel revela-se, sem escrúpulos, numa benesse
concedida pelo chefe do governo, o Presidente José Eduardo dos Santos,
aos seus subordinados.
 
Um jurista, que preferiu escrever sob o anonimato, descreve a
privatização da Movicel como um “acto administrativo que padece do
vício de desvio de poder por motivo de interesse privado”. Segundo o
jurista, esse desvio ocorre “quando a administração não prossegue um
fim de interesse público, mas um fim de interesse privado - por razões
de parentesco, de amizade (…), por motivos de corrupção, ou quaisquer
outros de natureza particular”.
 
Enquanto empresa pública, a Movicel era uma das empresas mais
rentáveis e mais bem organizadas do Estado, com mais de 2.5 milhões de
clientes. A privatização da Movicel não contribui para a sua maior
eficiência ou em mais receitas para os cofres do Estado. Todavia, o
acto desencoraja a competitividade do mercado e o empresariado
nacional por reforçar o controlo do sector privado por parte dos
governantes que assumem a dupla função de empresários, através da
pilhagem do património público.
 
O jurista acima referido considera, logo à partida e muito bem, sobre
a nulidade da privatização da Movicel, que “a falta de concurso
público, quando legalmente exigível, torna nulo o procedimento e o
subsequente contrato, por preterição de um elemento essencial (Artigos
76º, nº 2, alínea f) e 127º do Decreto-Lei nº 16-A/95, de 15 de
Dezembro)”. O argumento do jurista é o seguinte:
 
“Estatui o Artigo 77º do mesmo diploma legal que: 1. O acto nulo não
produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de
nulidade. 2. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer
interessado e pode ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer
órgão administrativo ou por qualquer tribunal”.
 
Outrossim, os agentes públicos, acima descritos como beneficiários da
privatização da Movicel, cometem um acto conducente ao enriquecimento
ilícito de acordo com a Lei da Probidade Pública (art. 25º, a) porrecebimento
de percentagem num negócio privado com o Estado. Os mesmos
agentes cometem ainda actos lesivos ao património público, segundo a
Lei da Probidade Pública (art. 26º, 2, a) por integrarem, no seu
património particular, uma empresa pública.
 
Outra questão grave, na privatização da Movicel, tem a ver com a
natureza do regime que depende, de modo extremo, dos serviços
de segurança ao contrário
dos preceitos do Estado de direito.
As telecomunições são uma área
muito sensível para os serviços
de inteligência e fundamentais no
processo de vigia e controlo das
relações entre os cidadãos. O
controlo privado das duas operadoras
de telemóveis no país, por parte
do círculo presidencial, reforça o
poder privado e caprichoso de
controlar, através de escutas arbitrárias
e outros mecanismos malsãs,
a liberdade de expressão dos cidadãos.
O general Leopoldino Fragoso do
Nascimento, chefe de comunicações
da presidência, é accionista da
Unitel, através da Geni, que detém 25%
do capital da operadora.


Banco Espírito Santo Angola

 

A 10 de Dezembro de 2009, a empresa Portmill, Investimentos e
Telecomunicações (vide tabela acima), com oficiais afectos à Casa
Militar da Presidência da República à testa, realizou a compra de 24%
das acções do Banco Espírito Santo Angola (BESA) por 375 milhões de
dólares.4 O Banco Espírito Santo (Portugal) mantém a sua posição como
accionista maioritário, com 51,94% do capital social.
 
No entanto, o Banco Espírito Santo tem evitado pronunciar-se sobre a
sua relação com os accionistas da Portmill, escusando-se a responder
às questões submetidas pelo jornal português Público sobre o assunto.
A 19 de Julho, após conversa telefónica, o autor endereçou ao gabinete
de imprensa do BES as seguintes questões: “Como pode o BES ter
concretizado um negócio de 375 milhões de dólares com um grupo de
oficiais militares no activo? Não questionou a proveniência dos fundos
para o negócio e a licitude do acto?” O gabinete de comunicação do BES
respondeu que as questões devem ser remetidas ao BESA, como
instituição autónoma. Todavia, o autor insistiu junto da mesma
entidade, sem sucesso, em perguntar porque o titular das acções
vendidas à Portmill Investimentos e Telecomunicações foi o BES.
 
Esse negócio levanta duas questões pertinentes. Primeiro, sobre a
origem dos fundos que os militares no activo, como legítimos
proprietários da empresa, desembolsaram para a realização do negócio.
Segundo, coloca o banco português, liderado por Ricardo Salgado, numa
potencial situação de branqueamento de capitais adquiridos de forma
ilícita, porventura pilhados ao Estado angolano.
 
Os oficiais da Casa Militar e da Unidade de Guarda Presidencial têm
duas vias para a realização de capital, por posse de património ou por
recurso a empréstimo bancário.
Do ponto de vista legal estas duas opções alertam para os limites
materiais estabelecidos por lei. O agente público está proibido de
solicitar ou aceitar empréstimos “que possam pôr em causa a liberdade
da sua acção, a independência do seu juízo e a credibilidade e
autoridade da administração pública, dos seus órgãos e serviços” (Lei
da Probidade Pública, art. 5º).
 
A sociedade angolana desconhece que os novos parceiros do Banco
Espírito Santo sejam herdeiros de fortunas familiares ou alguma vez
tenham seguido uma carreira privada, como fonte de riqueza pessoal.
Excluída a possibilidade de posse de património lícito na ordem das
centenas de milhões de dólares, resta a possibilidade de empréstimo.
Conforme a lei acima referida, a concessão de um empréstimo bancário
avultado a oficiais superiores do exército angolano, com a tarefa de
garantir a protecção física do Presidente da República e da
presidência em geral, levanta sérias questões de segurança nacional e
física do mais alto magistrado da nação. Essa questão merecerá
comentários adicionais no capítulo referente às conclusões.
 
Por outro lado, a Lei da Probidade Pública estabelece como acto de
enriquecimento ilícito (art. 25º, g) “adquirir, para si ou para
outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública,
bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução
do património ou à renda do agente público”.
 
Nem o Banco Espírito Santo, uma entidade idónea e de reputação
internacional nem a Casa Militar do Presidente da República estão em
condições de explicar a proporcionalidade dos vencimentos dos oficiais
das Forças Armadas Angolanas, em questão, com a grandeza da parceria

assinada.
 
Todavia, o chefe da Casa Militar e ministro de Estado, general
Kopelipa, o general Leopoldino Fragoso do Nascimento, seu principal
colaborador, e Manuel Vicente devem responder publicamente sobre a
transacção das acções da Portmill. Por que razão, enquanto
proprietários, transferiram a titularidade da Portmill a membros da
Guarda Presidencial? Nessa operação, é notável o papel executor de
Ismênio Coelho Macedo, que também exerce a função de administrador do
Banco Privado Atlântico (BPA), uma instituição privada da qual a
Sonangol detém 19.50% do capital social. Até ao ano 2000, Ismênio
Coelho Macedo dirigia, em Angola, o Banco Português do Atlântico
(BPA).
 
Importa, no entanto, referir que a promiscuidade entre o dever público
e os interesses privados é uma prática aperfeiçoada na Presidência da
República envolvendo a família presidencial. Por exemplo, em 2004, o
Presidente José Eduardo dos Santos achou bem a criação da sociedade de
gestão de negócios Luzy, entre a sua filha Tchizé dos Santos, o chefe
da Unidade de Guarda Presidencial, general Alfredo Tyaunda, e o então
assessor do presidente, general Clemente Cunjuca. Este último exerce
actualmente as funções de vice-ministro dos Veteranos de Guerra.
 
Do mesmo modo, a 30 de Maio de 2001, os generais Kopelipa, Alfredo
Tyaunda e Clemente Cunjuca formaram uma sociedade de negócios, a Lunha
Imobiliária, com o então chefe da Casa Civil do Presidente da
República, José Leitão. Os referidos altos funcionários da presidência
consolidaram a estrutura accionista da Lunha com a participação do tio
(padrinho) e sobrinho de José Eduardo dos Santos, respectivamente José
Pereira dos Santos Van-Dúnem e Catarino Avelino dos Santos. Em 2002,
essa empresa juntou-se a quatro offshores, nomeadamente, Valuta
Investimentos, Landon Holdings, Oakleigh Holdings e Osmond
Investimentos, na criação da Lunha Investimentos. Esta, por sua vez,
ergueu recentemente, no terreno ligado à Casa Militar, no Morro Bento,
um condomínio exclusivo com 58 vivendas de luxo, onde os preços por
unidade chegam a atingir os quatro milhões de dólares.
 
Biocom – Companhia de Bioenergia de Angola, Limitada
 
O Conselho de Ministros aprovou, a 24 de Julho de 2009, o projecto
Unidade Agro-Industrial de Cacuso - Malanje para o cultivo e produção
de cana de açúcar. Orçado em 272.3 milhões de dólares, o projecto visa
a produção de açúcar, álcool e energia eléctrica.
 
Para o efeito, a 25 de Outubro de 2007, a multinacional brasileira
Odebrecht, a empresa privada angolana Damer Indústria S.A e a Sonangol
Holdings constituiram a Companhia de Bionergia de Angola (Biocom). As
duas primeiras detêm 40% do capital social da empresa proprietária da
Unidade Agro-Industrial de Cacuso, ao passo que a petrolífera nacional
fica com 20% das acções.
 
A Odebrecht predispos-se a responder às questões sobre a sua
participação na Biocom, mas não pode fazê-lo a tempo devido às férias
do seu responsável para os biocombustíveis.
 
Como é corrente nos investimentos de vulto aprovados pelo Conselho de
Ministros e nas parcerias entre multinacionais estrangeiras e empresas
privadas angolanas, parte considerável do capital social é reservada a
dirigentes. A Damer Indústria S.A, criada a 26 de Julho de 2007,

pertence, de forma equitativa aos generais Manuel Hélder Vieira Dias
Júnior “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento em associação a
Manuel Vicente, presidente e director-geral do Conselho de
Administração da Sonangol.
 
No documento de aprovação do projecto oficializado como Resolução nº
63/09 de 18 de Agosto, o Conselho de Ministros reiteirou que o mesmo
cumpre com o desiderato, entre outros, de fomento do empresariado
angolano. A Damer foi criada três meses antes de se estabelecer a
Biocom e os seus proprietários não são empresários, mas agentes
públicos. A Lei da Probidade Pública considera agente público,
“a pessoa que exerce mandato, cargo, emprego ou função em entidade
pública, em virtude de eleição, de nomeação, de contratação (…). De
forma específica a lei enquadra os membros da administração central
(artº 2, d), os gestores de património público afectos às Forças
Armadas Angolanas (artº 2, h) e os gestores de empresas públicas
(ibid., i) como agentes públicos”.
 
Assim, o projecto padece de vários vícios de corrupção. Primeiro, a
multinacional Odebrecht incorre no acto de tráfico de influência e
corrupção de dirigentes angolanos. A definição e criminalização de
actos de suborno e corrupção de agentes públicos consta dos artigos
318º a 323º do Código Penal, para os quais a Lei dos Crimes contra a
Economia (Lei nº 13/03) remete juízo.
 
Por sua vez, as convenções da União Africana (Artigo 4º, 1, f) e das
Nações Unidas contra a Corrupção (Artigo 18º, a, b), assim como o
Protocolo da SADC contra a Corrupção (Artigo 3º, 1, f) definem com
clareza, e de forma similar, o tráfico de influência como um acto de
corrupção. Esses tratados foram incorporados no direito angolano
é-lhes aplicada moldura penal através do Artigo 321º do Código Penal
angolano.
 
O presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Manuel Vicente,
engaja a subsidiária Sonangol Holdings e fundos públicos no negócio da
Biocom, no qual é sócio privado, num acto contrário à lei.
 
Ademais, de acordo com o semanário O País6, o Banco Africano de
Investimentos (BAI) lidera um sindicato para a concessão de
financiamento ao projecto, no valor de 168 milhões de dólares. O BAI é
um banco privado cujo maior accionista é uma entidade pública, a
Sonangol, e tem como seu vice-presidente Manuel Vicente. Numa
promiscuidade vertiginosa, Manuel Vicente também é sócio privado do
BAI, com 5% das acções, através da sua empresa offshore ABL.7 Ao usar
a sua posição de gestor da Sonangol na obtenção de 5% do capital
social do BAI, para enriquecimento pessoal, Manuel Vicente incorre
também em actos de corrupção previstos no Código Penal (art. 321º).
 
O negócio engaja a pessoa do Presidente José Eduardo dos Santos.
Durante a sua visita ao Brasil, de 22 a 25 de Junho de 2010, o chefe
de Estado encontrou-se com com o presidente da Odebrech, Marcelo
Odebrecht, com quem abordou o projecto Biocom e a vontade desta
multinacional em expandir os seus investimentos no país.
 
No seu discurso oficial, durante o encontro com o presidente Lula da
Silva, José Eduardo dos Santos pediu o apoio do Brasil (…) para os
“projectos que visam criar fontes alternativas de energia, tanto a
solar como a de biocombustíveis, para as quais a já significativa
experiência brasileira nesses domínios poder ser de grande ajuda”.
 
Essa preocupação presidencial para um negócio poluído pela corrupção,
dos generais mais próximos de si e sobre quem repousa a segurança do
seu poder, coloca-o na dúbia posição de patrocinador de tais actos ou
de refém dos mesmos.
 
Nazaki Oil
 

Através dos Decretos-Lei nº 14/09 e nº 15/09 de 11 de Junho de 2009, o
Conselho de Ministros concedeu à Sonangol, como concessionária
nacional, “os direitos mineiros de prospecção, pesquisa,
desenvolvimento e produção de hidrocarbonetos líquidos e gasosos (…)”
dos blocos 21 e 9 em águas profundas, respectivamente. Essa decisão
conforma a Lei n° 10/04 (art. nº 44, 2), segundo a qual todos os
direitos acima referidos serão concedidos pelo Estado à Sonangol.
 
Para o efeito, o governo ratificou o consórcio estabelecido entre a
Sonangol, a empresa privada angolana Nazaki Oil & Gás e a empresa
americana Cobalt International Energy, sendo a última designada como
operadora dos Blocos 9 e 21. A Cobalt International Energy, tem como
fundadores e principais accionistas o Goldman Sachs, e a sociedade
entre o Grupo Carlyle e a Riverstone Holdings, com um investimento
inicial, em 2005, de 500 milhões de dólares.De certo modo, estes dois
últimos sócios investem, também, no negócio, fundos públicos
angolanos. A Sonangol tem investidos nos fundos de energia do Grupo
Carlyle/ Riverstone Holdings cerca de 500 milhões de dólares.
 
A Cobalt, de acordo com a Global Witness, recusou-se a identificar os
proprietários da Alper Oil e da Nazaki argumentando que o acto
“envolveria a revelação selectiva de informação restrita sobre a
compania e, em alguns casos, fazê-lo seria uma violação das cláusulas
de confidencialidade a que *a Cobalt+ está sujeita”. Este argumento é
falacioso porquanto a legislação angolana não prevê a protecção de
actos de corrupção mediante confidencialidade quer mediante outros
quaisquer mecanismos jurídicos, pois a corrupção está bem definida
como acto ilícito e de natureza criminal.
 
Todavia, a Cobalt sustenta, junto das autoridades americanas, que “nós
não trabalhámos com nenhuma destas companhias no passado e, por
conseguinte, a nossa familiaridade com essas empresas é limitada.
Violações da FCPA (Lei das Práticas Corruptas no Estrangeiro) podem
resultar em duras sanções criminais ou civis, e podemos estar sujeitos
a outros procedimentos, que afectariam negativamente o nosso negócio,
os resultados operacionais e a condição financeira”.
 
Os principais executivos da Cobalt, incluindo o seu director-geral
Joseph Bryant, têm vasta experiência de trabalho em Angola, como
gestores da British Petroleum no país, e o argumento que apresentam
revela uma fraca justificação perante as leis americanas e desprezo
pela legislação angolana, como adiante se demonstra.
 
Para conhecimento público, a Nazaki Oil & Gás tem como proprietários,
com quotas iguais, o chefe da Casa Militar do Presidente da República
e ministro de Estado, general Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, o
chefe de Comunicações do Presidente da República, general Leopoldino
Fragoso do Nascimento “Dino”, e o patrão da Sonangol, Manuel Vicente.
Quatro subordinados do general Kopelipa são usados como
testas-de-ferro da empresa, possuindo cada 0,01% das acções da Nazaki.
Estes são o coronel José Manuel Domingos “Tunecas”, seu director de
gabinete, coronel João Manuel Inglês, logístico, coronel Belchior
Inocêncio Chilembo, conselheiro. O quarto beneficiário, Domingos
Manuel Inglês, é o assistente privado do general, nos seus negócios.
 
Esta empresa tem ainda três outras subsidiárias, respectivamente a
Nazaki Distribuição – Sociedade de Distribuição de Combustível e
Lubrificantes SA, Nazaki Refinaria – Sociedade de Refinação e Petróleo
SA, e a Nazaki Petroquímica – Sociedade Petroquímica SA, criadas a 23
de Julho de 2008.
 
A 24 de Fevereiro de 2010, a Cobalt International Energy assinou os
Acordos de Risco (Risk Services Agreements), para as operações de
exploração, pesquisa e produção nos Blocos 9 e 21 offshore. Os acordos
foram assinados com a Sonangol, a Sonangol Pesquisa e Produção, a
Nazaki Oil & Gás S.A e mais uma empresa privada angolana, inicialmente
não prevista na autorização do governo, a Alper Oil. Para os Blocos 9
e 21, a estrutura accionista é a mesma: Cobalt (40%), Nazaki (30%),
Sonangol Pesquisa & Produção (20%) e Alper Oil (10%).
 
Segundo a Cobalt, esta “obteve a aprovação escrita da Sonangol, datada
de 3 de Março de 2010, para os gastos realizados nos trabalhos
técnicos dos Blocos 9 e 21 em offshore, como despesas prévias dos
Acordos de Risco, para futuras deduções em impostos. Como resultado, a
Nazaki reembolsará a companhia pelas suas obrigações financeiras no
bónus de concessão e custos relacionados com estudos
sísmicos nos referidos blocos.” A Cobalt pagou, à Sonangol, os 3.7
milhões de dólares do bónus de assinatura devidos pela Nazaki (art.
21º, 1, do contrato para o Bloco 21) e 1.5 milhões de dólares (art.
21º, 1, do contrato para o Bloco 9).
 

Como pode uma empresa americana listada na bolsa de Valores de Nova
Iorque (New York Stock Exchange) e que emprega duas reputadas firmas
de advogados, justificar pagamentos em nome de uma empresa privada
(Nazaki) do círculo mais restrito do presidente angolano, mesmo a
título de reembolso?
 
A atribuição dos Blocos 9 e 21 ao consórcio liderado pela Cobalt, sem
concurso público, revela, também, o pleno conhecimento dos verdadeiros
beneficiários do negócio por parte do então primeiro-ministro e actual
presidente da Assembleia Nacional, Paulo Kassoma, que ratificou a
decisão, e do Presidente José Eduardo dos Santos, que a promulgou.
 
Do ponto de vista legal, as mais altas figuras do país patrocinam um
acto eivado de corrupção. A legislação angolana, como tem sido
demonstrado, proíbe os dirigentes e gestores públicos de realizar

negócios com o Estado para benefício e enriquecimento pessoal.
 
Por sua vez, a Cobalt, tal como o Banco Espírito Santo e a Odebrecht,
incorre também em actos criminais. A sua acção pode ser descrita como
um acto de tráfico de influências de dirigentes angolanos, de acordo
com as convenções da União Africana (Artigo 4º, 1, f) e das Nações
Unidas contra a Corrupção (Artigo 18º, a, b), assim como o Protocolo
da SADC contra a Corrupção (Artigo 3º, 1, f) que, de forma similar,
definem o tráfico de influência como um acto de corrupção. Esses
tratados foram incorporados no direito angolano e se lhes é aplicada
moldura penal através do Artigo 321º do Código Penal angolano para o
acto em questão. Como exemplo, a Cobalt esteve envolvida em
negociações com o presidente do Conselho de Administração e
director-geral da Sonangol, Manuel Vicente, enquanto representante do
Estado. A parceria com a Nazaki, de Manuel Vicente e os generais Dino
e Kopelipa, este último a sombra do presidente, configura não só
tráfico de influência como também um acto de corrupção activa de
dirigentes, de acordo com o Código Penal angolano (art. 321º).
 
A falta de transparência em Angola, e no sector petrolífero em
particular, tem sido alvo de alguma atenção internacional por parte de
governos e ONGs ocidentais. Uma das instituições que teve maior
ousadia em obter do governo um compromisso para um maior escrutínio do
sector petrolífero, foi a Soros Foundation e Open Society Institute do
bilionário e filantropo americano George Soros. Após vários meses de
negociações, a 13 de Novembro de 2003, Soros esteve em vias de
assinar, na embaixada de Angola em Washington DC, um acordo com a
Sonangol e o governo angolano, para garantir a transparência na
governação e, em particular, no sector petrolífero.
 
Passados sete anos, George Soros aparece como accionista de referência
da Cobalt, através da Soros Fund Management, que detém 5.9 milhões de
acções na petrolífera americana, avaliadas em 81.1 milhões de dólares.
O escritório de Soros manifestou a sua indisponibilidade, por motivos
de viagem, em comentar sobre a sua participação no negócio.
 
O acordo de transparência de Soros, de cuja assinatura o governo
desistiu à última hora, previa assistência técnica e financeira às
autoridades angolanas e à Sonangol para a implementação de reformas
afins. Incluía também acções no sentido de melhorar a imagem do
governo e da Sonangol, no exterior, para maior acesso aos mercados
internacionais de capital entre outras vantagens aliciantes.
 

Nos últimos sete anos, membros do regime, e por consequência os
gestores da Sonangol, têm tornado cada vez mais patente os seus actos
de corrupção e de pilhagem do património do Estado, causando maior
empobrecimento e desnorte à maioria dos angolanos.
 
O exemplo de Soros revela, entre muitos outros, como os grandes
poderes internacionais, quer ao nível de países quer ao nível de
instituições internacionais se renderam aos encantos do petróleo e da
corrupção em Angola. Soros é também um dos principais impulsionadores
de iniciativas internacionais como a Publish What you Pay, Revenue
Watch Institute, Extractive Industries Transparency Initiative, que
obrigam os governos corruptos dos países mais fracos a ser mais
transparentes.

Media Nova
 
A 14 de Dezembro de 2008, a TV Zimbo iniciou, de forma polémica, as
suas emissões como o primeiro canal privado de televisão em Angola sem
que haja, até à data, regulamento legal necessário. A Lei de Imprensa
estabelece (art. 59º) que o “exercício da actividade de televisão está
sujeito a licenciamento prévio mediante concessão outorgada através de
concurso público, no quando do Plano Nacional de Televisão e obedece
aos preceitos da legislação angolana e das convenções internacionais
sobre a matéria.” Por sua vez, a mesma lei determina que o exercício
da actividade de televisão (art. 60º, 3) deve obedecer a uma “lei
especial que regula os mecanismos de licenciamento e as demais
condições para o exercício da actividade de televisão”. Até à data,
essa lei especial ainda não foi aprovada mantendo-se, assim, as
emissões da TV Zimbo à margem da lei.
 
A falta de informação pública sobre os proprietários da TV Zimbo
adensou as suspeitas da sociedade, célere em especular, e de forma
correcta, que tal acto de impunidade, no sector da comunicação social,
apenas poderia partir do círculo presidencial.
 
Criada a 27 de Dezembro de 2007, a TV Zimbo tem como accionistas o
general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, chefe da Casa
Militar do Presidente da República e ministro de Estado, o general
Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”, chefe de Comunicações do
Presidente da República e Manuel Vicente, presidente do Conselho de
Administração e director-geral da Sonangol, que controlam, de forma
equitativa, 99,96% das acções da televisão.
 
Simbolicamente, o general Kopelipa distribuiu de forma igualitária,
0,04% das acções aos seus cabos mais leais, os coronéis José Manuel
Domingos “Tunecas”, João Manuel Inglês, e Belchior Inocêncio Chilembo,
assim como Domingos Manuel Inglês, seu assistente privado.
 
A TV Zimbo, integra o património do grupo Media Nova. Este, por sua
vez, anima a estratégia de controlo editorial do sector privado da
comunicação social em Angola. A Rádio Mais, que emite em três
províncias, nomeadamente Luanda, Huambo e Benguela faz parte do grupo
Media Nova. A expansão desta rádio tem decorrido em paralelo com o
impedimento governamental, há vários anos, de que a emissora católica
de Angola, Rádio Ecclésia, emita em 10 províncias do país onde tem
instalado repetidores de FM. O sector de imprensa da Media Nova inclui o
semanário generalista O País, o Semanário Económico, a revista Exame
Angola e a revista Chocolate. O jornalista João Van-Dúnem, antigo
editor do serviço em português da BBC, é o presidente do Conselho de
Administração do grupo Media Nova.
 
O triumvirato Kopelipa, Dino e Manuel Vicente, como proprietários da
Damer Indústrias S.A, surgem com um investimento público de cerca de
30 milhões de dólares para a construção de um moderno parque gráfico
no país, a que baptizaram de Gráfica Damer. Essa gráfica, a maior do
país, foi inaugurada a 13 de Novembro de 2008, pelo ministro da
Indústria, Joaquim David.
 

O grupo Medianova, cujo investimento inicial ultrapassa os 70 milhões
de dólares, segundo quadros seus, tem a mesma estrutura accionista das
suas subsidiárias. Os generais Kopelipa e Dino, assim como Manuel
Vicente são os donos com quotas iguais. Os quatro subordinados do
general Kopelipa os coronéis José Manuel Domingos, João Manuel Inglês
e Belchior Inocêncio Chilembo, bem como o seu assistente privado
Manuel Domingos Inglês exercem o papel de testas de ferro, com
variações de 0,01% das acções cada a 0,02%, como no caso da Media Nova
Marketing, criada para o controlo do mercado da publicidade.
 
World Wide Capital
 
Tendo realizado avultados investimentos , com fundos de origem
desconhecida, no exterior do país, particularmente em Portugal, o
ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente da República,
general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, também exerce
funções privadas além fronteiras.
 
O general Kopelipa mantém-se, até à data presente, como membro do
Conselho de Administração da World Wide Capital, SGPS, S.A, uma
holding sedeada na residência do seu principal sócio em Portugal,
Filipe Vilaça Barreiros Cardoso, na Avenida da Liberdade, em Lisboa.
Esta empresa de que o general é o principal sócio, é o quarto maior
accionista do Banco BIG, em Portugal, com 7,9% das acções. O
presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Manuel Vicente,
que também figurava na lista dos accionistas do BIG, com 4,9% das
acções, transferiu-as recentemente para uma empresa controlada pelo
seu enteado Mirco Martins, conforme notícia do jornal Público, a 20 de
Maio de 2010. O BIG mantém, sob custódia, os 469 milhões de acções que
a Sonangol tem no maior banco privado português, o Millenium BCP,
correspondentes a 9,6% do capital total da referida instituição
financeira segundo o relatório e contas da Sonangol de 2008.
 
A legislação angolana não permite que dirigentes angolanos acumulem
funções públicas com privadas. Infere-se, pelo acto, que o poder do
general Kopelipa está acima da lei.

Lumanhe
 
O general Kopelipa também se encontra formalmente representado no
sector dos diamantes, como accionista da Lumanhe. A 13 de Fevereiro de
2004, um grupo de seis generais teve de ceder, de forma igualitária,
quotas na empresa mineira Lumanhe a favor do actual ministro de Estado

e chefe da Casa Militar do Presidente da República. Essa cedência
ocorreu num momento de franca ascensão do poder do general Kopelipa e
o seu controlo cada vez maior sobre as Forças Armadas Angolanas (FAA)
e os sete generais passaram a dispor cada de 14.28% do capital.
 
Os generais Armando da Cruz Neto, Carlos Hendrick Vaal da Silva e
Adriano Makevela Mackenzie continuam activos em funções oficiais
respectivamente como governador de Benguela, Inspector do Estado-Maior
General das FAA, e chefe da Direcção Principal de Preparação de Tropas
e Ensino do Estado Maior General das FAA . Os outros três generais
dedicam-se hoje, exclusivamente, aos negócios e são os antigos chefe
de Estado-Maior General das FAA, chefe do Estado Maior do Exército e
chefe dos Comandos, nomeadamente João de Matos, e os irmãos Luís e
António Faceira.
 
Cinco dias depois da entrada do general Kopelipa na sociedade, a 18 de
Fevereiro de 2004, o general Carlos Hendrick Vaal da Silva, assinou,
como representante da Lumanhe, um acordo com a Endiama e a ITM Mining
para o estabelecimento da Sociedade Mineira do Chitotolo. O Estado,
através da Endiama, transferiu, por essa via, 15% do capital social do
Chitotolo aos generais. A Lumanhe detém ainda 21% da  Sociedade
Mineira do Cuango (SMC), em parceria com a Endiama (41%) e a ITM
Mining (38%).
 
A SMC é responsável pela violação sistemática dos direitos humanos na
vila de Cafunfo, na bacia do Cuango, onde detém uma grande concessão
mineira. Homicídios, torturas, destruição de lavras, e policiamento
arbitrário são parte dos actos de rotina
da Sociedade Mineira do Cuango contra os aldeães e garimpeiros. A SMC
goza da impunidade dos generais que lucram com o negócio. Um novo
relatório sobre os direitos humanos na região está para breve.
 

Um governo europeu também se encontra envolvido com os negócios
obscuros dos generais. Trata-se do governo português. A 30 de Junho de
2009, o consórcio ITM Mining/Lumanhe terminou o contrato de operações
na Sociedade Mineira de Calonda, onde mantinha uma participação de 50%,
enquanto a Sociedade Mineira do
Lucapa, detentora da concessão de
exploração diamantífera, garantia a
outra metade das acções.
A Parpública SGPS, uma holding detida em 100%

pelo Estado português, controla 81,13% do capital da Sociedade
Portuguesa de Empreendimentos (SPE) que, por sua vez, detém 49% das
acções da Sociedade Mineira do Lucapa. À estatal angolana Endiama cabe
o capital maioritário.

Conclusões
 
O controlo privado da Presidência da República reflecte, de modo
cabal, a prática sistemática do Presidente José Eduardo dos Santos em
enfraquecer as instituições do Estado, chamando a si todos os poderes.
Por conveniência pessoal, o presidente apenas atribui poderes reais
aos seus escolhidos, independentemente do cargo, garantindo, assim, a
supremacia do culto de personalidade sobre as instituições do Estado.
Exemplo dessa prática são os excessivos poderes atribuídos ao chefe da
Casa Militar do Presidente da República, general Manuel Hélder Vieira
Dias Júnior “Kopelipa”.

O Estatuto da Casa Militar do Presidente da República (art. 21, 1, d)
confere ao general Kopelipa o poder de representar o Presidente da
República, função essa que constitucionalmente cabe ao vice-presidente
da República e ao presidente da Assembleia Nacional.
 
Durante anos, o general Kopelipa tem sido o principal responsável
pelas negociações com a China e a gestão das suas linhas de crédito
avaliadas, até à data, em mais de 10 biliões de dólares, na sua
qualidade de director do Gabinete de Reconstrução Nacional.17 Nessa
tarefa, o general tem tido, como seu principal colaborador o
presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Manuel Vicente.
 
Até à demissão do general Kopelipa do cargo de director do Gabinete de
Reconstrução Nacional, em Abril passado, não há qualquer informação
pública de que alguma vez esta instituição tenha prestado contas da
aplicação dos fundos chineses e de outras operações, dentro e fora de
Angola, e que envolvem a Sonangol.
 

O papel do português Ismênio Coelho Macedo, como intermediário das
operações ilícitas do general Kopelipa, coloca-o na privilegiada
posição de um dos estrangeiros com maior influência nas decisões
presidenciais sobre a economia política de Angola. O gestor é também o
administrador do Banco Privado Atlântico, no qual a Sonangol detém
19,5% do capital.
 
Na realidade, a política de tolerância zero contra a corrupção,
anunciada pelo Presidente José Eduardo dos Santos, apenas serve de uma
nova capa de encobrimento político da pilhagem do país por parte dos
seus próximos. Por outro lado, a medida serve como expediente para
garantir maior legitimidade internacional e assegurar o status quo. Ou
seja, o país está a saque com apoio internacional. Esta constatação
deve-se, em parte, à demonstração de falta de autoridade moral e
política, por parte do Presidente José Eduardo dos Santos em refrear,
no mínimo, os ímpetos dos seus mais directos colaboradores, que
vulgarizam a Presidência da República e a esta conferem a imagem de um
verdadeiro antro de ladrões e de corruptos.
 
Os níveis incomportáveis de corrupção no aparato de segurança
presidencial representam um grande perigo para a soberania do país e
para a segurança do próprio presidente. O Estado e o presidente podem
estar reféns de uma estrutura a que o académico camaronês, Achille
Mbembe, considera de governo privado indirecto. Ou seja, o uso de
funções públicas e deveres correspondentes, conferidos pela soberania
nacional, por operadores privados e para fins privados.

Ademais, o controlo privado das telecomunicações e da comunicação
social pelos homens do presidente representa um verdadeiro golpe à
possibilidade de democracia no país, para além do mero acto eleitoral.
 
As acções do triumvirato formado pelos generais Kopelipa, e Leopoldino
Fragoso do Nascimento e Manuel Vicente encontram terreno fértil numa
sociedade onde os cidadãos lutam pela sobrevivência económica, física
e moral, sem que prestem a devida atenção à funcionalidade do Estado.
Todavia, o descaso da sociedade pelos efeitos nefastos da corrupção e
da privatização da Presidência da República pode também criar um vácuo
no poder institucional, pelo distanciamento dos actuais dirigentes,
que trocaram o povo pelo dinheiro.

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