segunda-feira, 26 de abril de 2010

Os mauzões da fita

Os clubes de futebol alemães nunca são notícia por fazerem contratações de jogadores a preços estapafúrdios. Um observador menos atento pode pensar que é porque não têm dinheiro para exorbitâncias. Mas qualquer adepto germânico desmentirá esta possibilidade...

Os clubes de futebol alemães nunca são notícia por fazerem contratações de jogadores a preços estapafúrdios. Um observador menos atento pode pensar que é porque não têm dinheiro para exorbitâncias. Mas qualquer adepto germânico desmentirá esta possibilidade.
Na maior e mais competitiva economia da Zona Euro, as prioridades das equipas que praticam o desporto-rei são as mesmas que noutras regiões. Lutam por ganhar troféus e muitas vezes são bem sucedidas. Mas não alcançam as suas metas desportivas à custa de uma gestão irresponsável. Pelo contrário. Os clubes são conservadores e prudentes na gestão, o que os coloca a salvo das situações de excessivo endividamento e de pré-falência que afectam alguns dos seus principais concorrentes estrangeiros, muitos deles oriundos do sul da Europa.
O exemplo do futebol alemão ilustra uma mentalidade que deve servir de exemplo mas que, no calor das discussões sobre os culpados e as portas de saída da actual crise, tem sido fustigada de forma errada. Na Grécia, em Portugal e em diversas capitais europeias, suspira-se pelo dia em que os alemães larguem os seus hábitos de poupança e se dediquem a mergulhar numa espiral de consumo e de endividamento destinada a salvar as economias europeias em pior situação.
A verificar-se, esta possibilidade poderia, de facto, ajudar a resolver alguns problemas. Mas é necessário não cair em raciocínios falaciosos. Para incutir algum crescimento capaz de ajudar a corrigir os desequilíbrios externos que se verificam entre as nações mais débeis da Europa, seria necessário que os consumidores alemães gastassem mais dinheiro mas, sobretudo, que decidissem consumir produtos fabricados além-fronteiras, de preferência em exclusivo.
Em vez de comprarem um novo BMW quando optassem por trocar de carro, deveriam escolher um automóvel fabricado em qualquer outro lado. Em Portugal ou na Grécia, por exemplo. Para a ajuda ser mais eficaz, deveriam preferir sempre produtos estrangeiros, em detrimento dos que saem das fábricas localizadas em solo alemão. E é aqui que se pode encontrar o busílis da questão.
Uma parte do sucesso da economia alemã está na sua capacidade para gerar uma elevada taxa de poupança. E no facto de os recursos acumulados terem sido aplicados em investigação e desenvolvimento, o que resultou no aparecimento e consolidação de produtos e marcas que garantem qualidade e fiabilidade. Fazem parte dos sonhos de consumo de milhões de pessoas em todo o Mundo.
A Alemanha poupou e trabalhou para ter sucesso. Conseguiu-o. O que têm países como Portugal para oferecer aos consumidores alemães e que os façam substituir o consumo de bens produzidos internamente por outros importados? É esta a questão que, de Portugal à Grécia, tem que ser resolvida, a par de um ataque sério, responsável, sem maquilhagens, ao estado depauperado das respectivas finanças públicas.
Países que derreteram as verbas dos fundos estruturais sem terem melhorado a sua competitividade têm escassa legitimidade para exigir à Alemanha que pague a crise. Primeiro, têm que fazer o trabalho de casa e provar que querem mudar de vida. Tudo o resto é pura demagogia e uma tentativa pífia de encontrar bodes expiatórios onde o que existe são bons exemplos. Nesta crise, os maus da fita não falam alemão.

João Silva

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